Ela era uma mulher sofrida que vivia embrulhada nos seus sonhos. Ele era um homem vivido que lhe soube fechar os olhos perante as realidades.
Ela arrastava-se numa vida onde a única cor que existia nos seus dias era o sorriso, com que ela se vestia para que o mundo não a visse chorar.
Foi a esse detalhe que ele se agarrou. Sendo um homem sabido a quem a vida já tinha ensinado muito, soube ler o que ela não escrevia e usou as suas palavras para a conquistar. Pegou em cada uma das frases sentidas que ela escrevia, no diário da sua vida, para a fazer tropeçar num amor que não tinha.
De história em história, com momentos que foi inventando e que se entrelaçavam em factos vividos, ele soube tornar-se num herói que ela cegamente julgou conhecer. Um ser que se dizia abandonado pelo destino a quem ela estendeu os braços para lhe oferecer o amor puro e ingénuo que sempre tinha guardado dentro de si. Já tinha sofrido tanto, que um dia prometeu a ela mesma que nunca mais se renderia ao amor, entretanto a habilidade dele levou-a por estrada escuras onde ela se perdeu, sem ver o que estava a acontecer.
Contou-lhe tanto sobre si que desnudou perante o seu maior inimigo. Aquele que tinha chegado preparado para semear mais sofrimento nos seus terrenos já alagado pelas lágrimas de todos os dias chorava escondida.
Deixou que ele a visse para lá de tudo o que escondia do mundo e ele usou a sua inocência para a atirar ao chão.
Acordou um dia para a realidade e viu-se embrulhada nos braços de um traidor. De alguém que usou a sua história para a destruir um pouco mais. Se já era uma mulher sofrida naquele instante sentiu-se um zero, aquilo a que todos chamam o zero à esquerda. Estava ali estendida naquele chão frio, onde nem o sorriso cruel dela a poderia aquecer. Sentia-se sem força para caminhar e quando se tentou levantar sentiu uma dor no peito que a fez desfazer em lágrimas.
Ele partiu certo de que se tinha tornado um herói, mas sem se lembrar que a vida tem boa memória e um dia lhe vai oferecer o troféu por tudo o que ele acabou de fazer. A vida sabe quem são os bons e castiga os cruéis.
Depois de ter amado sem medida, quem não a merecia ela ficou ainda com mais cicatrizes da vida, mas a razão sussurrou-lhe ao ouvido que tinha uma teia preparada onde em breve ele iria ficar preso. Ele iria provar o sabor amargo de amar e de ser abandonado por alguém que não sabe com que sentimento se escreve a palavra amor.
Ela a mulher sofrida, iria renascer daquelas cinzas e tornar-se-ia uma guerreira destemida. Já ele, um dia acordaria na berma de uma estrada escura onde só a solidão o iluminaria.
@angela caboz